"O HD é passado", declarou Albert Fert, calmamente, durante entrevista coletiva nesta quinta-feira. Prêmio Nobel de Física de 2007, ele liderou a pesquisa que descobriu a magnetorresistência gigante, fenômeno que fez com que os discos rígidos (hard drives, em inglês) ampliassem a capacidade de armazenamento e ficassem mais baratos, o que contribuiu largamente para a popularização dos computadores. Na quinta, recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre.
As memórias flash dos pen drives também já são passado, continua o físico francês, embora as previsões indiquem que essa tecnologia será superada em cerca de cinco anos. O futuro do armazenamento, para Fert, está nas memórias não voláteis. Diferente das RAMs de hoje, que têm os dados apagados quando desligadas e precisam reiniciar a cada vez, as não voláteis permitiriam que um computador fosse desligado e religado, voltando ao exato ponto em que estava antes.
A principal vantagem, segundo o físico, é que a nova tecnologia diminui o consumo de energia. "Melhorar as baterias é um problema difícil, é mais fácil diminuir o consumo de bateria dos dispositivos eletrônicos. A introdução de RAM não volátil reduz o consumo em 40%, por exemplo", afirmou Fert. Ele reforçou que a redução de consumo é uma demanda de inúmeros setores da sociedade global, bem como a redução de emissão de carbono.
"Não conheço todos os campos (relacionados à tecnologia), mas sei que no campo da eletrônica, um consumo menor pode ser obtido. Há tantos dispositivos eletrônicos ao nosso redor, e acho que há muito que podemos fazer", disse o Nobel. Mas Fert evitou arriscar palpites. "Não dá para dizer que vai ser uma coisa, a tecnologia avança em tantas direções, e às vezes há surpresas, não sou de adivinhar. Sei que no meu campo, vislumbramos avanços com novos tipos de computadores, novos dispositivos de comunicação via satélite por micro-ondas", enumerou.
Vida de Nobel
A pesquisa que rendeu a Fert o Prêmio Nobel de Física de 2007 foi realizada em 1988. Foi nesse ano que o físico francês descobriu a magnetorresistência gigante, efeito em nanoestruturas com camadas de metal ferromagnético e não magnético. A variação da resistência elétrica das estruturas, quando submetidas a campo magnético, é a base da ciência chamada de spintrônica, que estuda o movimento dos elétrons em círculos e como aproveitar sua energia.
Segundo Fert, ganhar a premiação não era seu objetivo de vida, mas foi "uma boa notícia". "Acho meu trabalho tão maravilhoso, tão emocionante, que isso trouxe um pouco de 'sabor a mais'", contou na entrevista em Porto Alegre. O cientista, que passa das 9h às 19h em seu laboratório quando está em Paris, admitiu que a vida ficou mais corrida depois do prêmio - dividido com o alemão Peter Grünberg, que também descobriu o fenômeno, no mesmo ano e independentemente.
"Acho mais emocionante experimentar e desenvolver novas ideias. Mas, além da vida normal de um físico, (depois do prêmio) também sou responsável por debater com políticos, com os estrategistas de pesquisa da universidade, tentar motivar jovens de ensino médio e universitários. Há tantas coisas para fazer", revelou ao falar sobre sua rotina.
O físico classifica o trabalho de cientista como "muito criativo", e nega que o campo que estuda seja menos prestigiado que outros, como a Literatura ou a Medicina. "São diferentes. Conheço colegas (da Física) que ganharam o Prêmio Nobel e que participam de programas de TV, e se tornam relativamente conhecidos. Não é o meu estilo, tenho tantas coisas para fazer que recuso muitos convites", afirmou.
Brasil
Questionado sobre a possibilidade de um brasileiro receber o Prêmio Nobel, diante dos fortes investimentos que o País tem feito em pesquisa e inovação, foi categórico. "Não há nada de especial em nenhum país. É preciso ser bom, seja na América do Sul ou na Europa", esclareceu. Para Fert, além de educação, é preciso para o desenvolvimento da ciência que haja comunicação com outros países, para estar a par das últimas descobertas.
"A América do Sul tem a desvantagem de estar longe da Europa e dos Estados Unidos. É difícil estando longe do centro", ponderou. "Dinheiro é importante, porque (o acesso a) a tecnologia é importante", complementou, sobre a necessidade de investimentos.
Para Fert, o investimento em ciência deve ser equilibrado com o financiamento de projetos em outras áreas do bem estar social, como saúde e educação.
O professor da UFRGS Mario Baibich, que fez pós-doutorado com Fert na França, destaca o papel do programa Ciência sem Fronteiras, que permite a estudantes brasileiros estudar em universidades estrangeiras com patrocínio do Governo. "O que chamava a atenção quando estudei com o professor Fert era a aceitação de culturas diferentes, a abertura a ideias novas. O Ciência sem Fronteiras faz exatamente isso, permite que os alunos convivam com pessoas de lugares diversos, e isso gera o aprendizado de conseguir admitir o novo. Ciência se faz assim", declara.
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