POR RODRIGO RODRIGUES
 
Em reunião de bancada na última terça-feira (18), o PT fechou questão em torno da necessidade de retomar a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, que, em acordo costurado por Eduardo Cunha (PMDB), foi parar na mão do polêmico pastor Marco Feliciano (PSC-SP).
 
Em mea culpa sobre a lambança que levou o pastor a liderar o grupo de parlamentares em defesa das minorias, o PT disse que não abrirá mão novamente do colegiado, já que tem a maior bancada do parlamento. Com a decisão, Marco Feliciano presidiu pela última vez a comissão nesta quarta-feira (18), onde foi acusado de racismo e homofobia contra minorias por diversos grupos externos de Direitos Humanos, no Brasil e no mundo ao longo do mandato.
 
Com a saída de Feliciano, os parlamentares que haviam renunciado ao colegiado para formar a Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos Humanos e Minorias e uma “sub comissão paralela” dentro das Comissões de Educação e Cultura, tendem a retornar aos postos originais no próximo ano.
 
Os deputados Érica Kokay (PT-DF), Domingos Dutra (SDD-MA), Jean Wyllys (PSOL-SP), Luiza Erundina (PSB-SP) e Chico Alencar (PSOL-RJ), já demonstraram interesse em retomar os postos e as atividades paralelas do grupo no próximo ano. 
 
O deputado Jean Wyllys, aliás, lamentou todo o ano de polêmicas e desrespeito de Marco Feliciano à frente da comissão da Câmara dos Deputados. Segundo o palamentar do PSOL, que foi o principal adversário do pastor no colegiado antes da renúncia, a gestão do deputado do PSC foi um “retrocesso para a luta das minorias” e significou um “ano quase perdido para a causa dos Direitos Humanos”. 
 
Confira o principal trecho da entrevista com o deputado Jean Wyllys:
 
A saída tão esperada de Marcos Feliciano da Comissão de Direitos Humanos e Minorias é uma vitória para os ativistas da causa?
Infelizmente a gente não tem o que comemorar. Se por um lado a saída dele significa que a comissão pode voltar a ter relevância para as discussões dos direitos das minorias, por outro significa que nós tivemos um ano praticamente nulo, sem conseguir avançar em questões importantes para o Brasil. Só não podemos dizer que foi um ano totalmente nulo porque a Frente Parlamentar que os deputados que renunciaram aos cargos formaram conseguiu manter algumas dessas discussões. Graças a boa vontade e parceria dos deputados que presidiam as Comissões de Educação e Cultura.
 
Mas a subcomissão que a gente formou não tinha dinheiro e estrutura para bancar as oitivas, pagar passagens aéreas para as pessoas irem depor em Brasília, para realizar as diligências nos locais onde crimes contra os direitos individuais são cometidos. A gente só espera que agora a comissão volte a ter a importância e grandeza que foi usurpada nesse processo.
 
O Feliciano diz que a gestão dele foi a melhor nos últimos anos, porque colocou a questão das minorias na pauta dos brasileiros. O sr concorda?
O Feliciano usou a comissão apenas como trampolim para colher dividendos eleitorais e atrair atenção da mídia com declarações e projetos polêmicos. Ele pautava projetos que atentavam contra a cidadania do grupo LGBT, como o da “Cura gay” ou o “Dia do orgulho hetero”, para atrair atenção e a fúria dos movimentos e posar de vítima, de que estava sendo atacado. Tudo com intenção eleitoral. A mídia pouco diz sobre isso, mas o “Fora Feliciano” foi um dos mais importantes combustíveis para as manifestações que tomaram as ruas no mês de junho. Todos devem se lembrar que, no meio de todas as reivindicações, havia um grupo enorme de pessoas indignadas com as declarações racistas e homofóbicas por parte dele e com um parlamento que deixava com que tudo isso continuasse acontecendo.
 
Essa escandalosa presença do Feliciano na presidência da Comissão foi uma lição para o PT, por ter renunciado ao direito de presidir o colegiado?
Ao longo do ano o PT já tinha feito um mea culpa sobre a manobra e a negociação que fez o PMDB entregar a comissão para o PSC. Em discursos na casa, o Arlindo Chinaglia, o José Guimarães e outros membros da legenda admitiram o descuido em relação a essa comissão tão importante. O partido tomou muita bordoada de entidades de Direitos Humanos. Eles compreenderam o dano que isso causou à legenda e à imagem dos parlamentares da própria sigla, que atuam e são respeitados por essas entidades, como a Érica Kokay, o Padre Ton e o Padre Luiz Couto. Até por isso que agora eles dizem que não vão abrir mão da comissão e devem entregar a presidência apenas para alguém da base que seja realmente comprometida com as lutas das minorias.
 
O Feliciano atrasou a agenda de Direitos Humanos no Brasil? 
É com tristeza que a gente reconhece essa triste página na história da comissão. Prova disso foi o Fórum Mundial de Direitos Humanos, que aconteceu no Brasil semana passada. Não havia nenhum representante da Comissão da Câmara no evento. Os deputados foram representados somente pela "Frente de Defesa dos Direitos Humanos e Minorias" que nós formamos e era a única que era reconhecida pelas entidades que lá estavam. O jornal Folha de São Paulo fez uma reportagem mostrando como foi improdutiva a gestão dele na comissão, comparando com a gestão do Domingos Dutra e da Manuela D’ávila.
 
Ele fez pouquíssimas audiências, pouquíssimas diligências e aprovou pouquíssimos projetos, que eram todas propostas que atentavam contra as minorias, sobretudo os LGBTs. Ou seja, foi uma gestão que atentou contra a própria razão de ser da comissão, estabelecido pelo regimento interno da Câmara. Feliciano não só descaracterizou, como também tornou ela improdutiva. Tudo em nome de uma vaidade pessoal. A saída dele resgata a razão de ser da Comissão de Direitos Humanos, depois de ano quase nulo.
 
A gestão Feliciano foi uma guerra dos gays contra os evangélicos?
Não tem nada a ver com os gays isso. O relatório da frente parlamentar que a gente apresentou no Fórum Mundial de Direitos Humanos prova isso. A maior parte das ações do grupo era investigar violações contra índios, negros e jovens negros assassinados nas periferias do País. As discussões sobre gays tomaram uma parte muito pequena dos trabalhos. O foco dele nos gays era uma provocação para atrair os holofotes.
 
Como último ato, Feliciano pautou o projeto de cotas para negros nos concursos públicos na comissão. Isso não é um avanço?
Óbvio que sim. É um projeto extremamente importante para a cidadania dos negros no Brasil. Mas foi uma tentativa última dele, no apagar das luzes, de espantar a pecha de racista que ele é. Como no Brasil o racismo é um crime hediondo e inafiançável, fica ruim para ele ter essa fama. Ele não se importa em aparecer como homofóbico, porque eleitoralmente é bom para ele. Mas ser conhecido como racista, como ele demonstrou ser em várias declarações anteriores, não é um bom negócio eleitoral. 
 
Com tanto destaque que o sr ganhou nesse episódio, combatendo as declarações polêmicas do pastor Feliciano, o sr pretende se candidatar a presidente da Comissão?
Não tenho essa pretensão e nem o meu partido tem bancada para isso. Acho que a próxima presidência deve ser entregue para o Domingos Dutra (SDD), a Erundina (PSB) ou a própria Érica Kokay, que é do PT e foi uma grande guerreira na formação da Frente Parlamentar de Direitos Humanos com a gente. Por merecimento seria muito justo que ela presidisse a comissão ano que vem. Certamente o grupo estaria em boas mãos.
 
FONTE:
http://terramagazine.terra.com.br/bobfernandes/blog/2013/12/20/jean-wyllys-%E2%80%9Csaida-de-feliciano-recupera-a-comissao-depois-de-ano-quase-nulo%E2%80%9D/