Às vésperas de participar da 70ª sessão da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, concedeu uma entrevista ao jornalista norte-americano Charlie Rose para o canais de televisão CBS e PBS.
Charlie Rose: O Sr. se apresentará com um discurso que todos aguardam ansiosamente. Será a sua primeira apresentação em muitos anos. O que o Sr. dirá na ONU aos EUA e a todo o mundo?
Vladimir Putin: Já que a nossa entrevista será divulgada antes do meu discurso, creio que seria inadequado expor tudo o que irei dizer. Mas, em termos gerais, é claro que eu lembrarei a história da Organização das Nações Unidas, e desde já posso dizer que a decisão de criar a ONU foi tomada justamente em nosso país, na União Soviética, durante a Conferência de Yalta. A URSS, a Rússia, como sucessora legal da URSS, é um país fundador da Organização das Nações Unidas e membro permanente do Conselho de Segurança.
Fica claro também que a ONU deve se adaptar às mudanças do mundo, e todos nós discutimos isso o tempo todo: como ela deve mudar, com que ritmo, o que deve mudar com qualidade.
Obviamente, terei que dizer, e não é que seja necessário, mas será preciso aproveitar essa tribuna internacional para expor a visão russa das relações internacionais e do futuro dessa organização e da comunidade mundial.
CR: Nós esperamos que Sr. fale sobre a ameaça do Estado Islâmico e sobre a presença russa na Síria, afinal esta última está ligada a isso. Qual é o objetivo da vossa presença na Síria, e como isso relaciona com a luta contra o EI?
VP: Eu acredito, simplesmente não tenho a menor dúvida, de que praticamente todos aqueles que se apresentarão na tribuna da Organização das Nações Unidas irão falar sobre a necessidade do combate ao terrorismo, e eu também não poderei fugir desse tema. Isso é natural, já que essa é uma grande ameaça para todos nós, é um desafio para todos nós. Hoje o terrorismo representa ameaça para muitos países do mundo, uma grande grande quantidade pessoas sofre de suas ações criminosas – centenas de milhares, milhões de pessoas. E todos temos diante de nós um objetivo – unir os esforços na luta contra esse mal comum.
Quanto a nossa, como o Sr. disse, presença na Síria, a mesma se exprime hoje no fornecimento de armamentos para o governo sírio, no treinamento de quadros, na prestação de ajuda humanitária ao povo sírio.
Nós partimos da Carta das Nações Unidas, ou seja, de princípios fundamentais do direito internacional, segundo o qual a ajuda, incluindo a ajuda militar, pode e deve ser prestada exclusivamente para governos legítimos dos países, mediantes o seu consentimento ou solicitação, ou por decisão do Conselho de Segurança da ONU.
Nesse caso, nós estamos lidando com um pedido do governo sírio sobre prestação de ajuda técnico-militar, e que nós estamos fazendo em total conformidade com contratos internacionais.
CR: O Secretário de Estado John Kerry declarou saudar o Seu apoio à luta contra o EI. Já outros acreditam que se trata de aviões de guerra e sistemas de defesa aérea portátil que são usados contra exército convencional, e não contra extremistas.
VP: Ali só existe um exército convencional legítimo. É o exército do presidente da Síria Assad. E a ele se contrapõem, segundo a interpretação de alguns dos nossos parceiros internacionais, a oposição. Mas, na realidade, na vida, o exército de Assad luta realmente é com organizações terroristas. Afinal, o Sr. sabe melhor do que eu sobre as audiências que acabaram de acontecer no Senado dos EUA, em que militares, representantes do Pentágono, se eu não me engano, relataram aos senadores o que foi feito pelos os EUA para a preparação das forças militares da oposição. Inicialmente o objetivo era de preparar 5-6 mil combatentes, depois – 12 mil. No fim das contas, revelou-se ter sido preparado um total de 60, enquanto apenas 4 ou 5 mil pessoas lutam com armas em mãos, e todos os restantes simplesmente passaram para o Estado Islâmico com as armas norte-americanas.
Em segundo lugar, ao meu ver, a prestação de ajuda militar a estruturas não legítimas não responde aos princípios do direito internacional e à Carta das Nações Unidas. Nós apoiamos exclusivamente estruturas governamentais legítimas.
Neste sentido, nós estamos oferecendo cooperação a países da região, estamos tentando criar um tipo de estrutura de coordenação. Eu informei isso pessoalmente ao presidente da Turquia, ao rei da Jordânia, à Arábia Saudita. Nós também informamos os EUA sobre isso, e o Sr. Kerry, citado pelo Sr., teve um debate aprofundado sobre isso com o nosso ministro das Relações Exteriores, Sr. Lavrov, bem como os nossos militares estão em contato discutindo esse tema. Nós ficaremos felizes caso encontrarmos uma plataforma comum para ações conjuntas contra os terroristas.
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