Integrantes do Movimento Passe Livre falam em infiltrados, revelam preocupação com manipulações de pauta e expõem próximos passos
Luiz Carlos Azenha, Viomundo
Fomos convidados para um encontro com integrantes e apoiadores do Movimento Passe Livre (MPL), que nas últimas duas semanas protagonizaram um episódio histórico: levaram o povo de volta às ruas para reivindicar. Desde crianças a pessoas da terceira idade. Foram vítimas de repressão só comparável àquela empregada pela Polícia Militar paulista na desocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos.
No meio da conversa, a notícia: o governador Alckmin e o prefeito Haddad anunciaram a redução das tarifas conforme o reivindicado pelo movimento.
Houve celebração.
Dentre os convidados, os blogueiros Rodrigo Vianna, Altamiro Borges, Leonardo Sakamoto e este que lhes escreve, o empresário de mídia Joaquim Palhares, o ativista Sergio Amadeu e a jornalista Maria Inês Nassif.
O objetivo era, basicamente, dizer que “sim, somos de esquerda e temos uma pauta de esquerda”. Ou: “Não, não seremos manipulados pela pauta da direita”.
O professor de História Lucas Oliveira, o Legume, falou em nome do MPL. Ele e ativistas ligadas ao movimento descreveram a unidade que conseguiram forjar com integrantes de partidos de esquerda nos últimos dias — PSOL, PSTU e PCO, entre outros — além de militantes do PT e de um grande número de movimentos sociais, dentre os quais o MST, a UJS (do PCdoB) e a UNE.
Sim, sim, estavam todos extremamente preocupados com a possibilidade de infiltração e manipulação da pauta do movimento por grupos de direita, que buscam se apropriar das manifestações para atacar o governo federal.
Negaram que os anarquistas estavam na origem da tentativa de retirar as bandeiras de partidos do movimento, dizendo que a iniciativa era de “caras-pintadas” recém-chegados.
Lembraram que era impossível controlar as multidões que se juntaram às manifestações — segundo uma pesquisa do Datafolha, a grande maioria saiu às ruas pela primeira vez.
Confirmaram o ato desta quinta-feira, comemorativo, na avenida Paulista.
Para as próximas mobilizações, pretendem reforçar os coletivos de segurança, comunicação e primeiros socorros.
O ativista digital Sergio Amadeu exibiu um gráfico mostrando que nos últimos dias o MPL tinha perdido protagonismo nas redes sociais relativamente a grupos de direita, que passaram a ter maior poder de mobilização de seguidores com seu perfil ideológico — o que talvez explique a aflição de muitos apoiadores do Passe Livre.
A próxima mobilização talvez tenha relação com a PEC 90, de autoria da deputada Luiza Erundina (PSB-SP), que torna o transporte um direito social. Além disso, trabalhando com o vereador petista Nabil Bonduki, o MPL pode tentar aprovar o passe livre na Câmara Municipal de São Paulo.
Todos estavam certos da presença de provocadores e agentes infiltrados durante as manifestações. Alguns, provavelmente da Polícia Militar, encarregados da coleta de imagens e informações. Outros, de grupos de extrema-direita, empenhados em promover vandalismo atribuído posteriormente ao MPL.
Numa avaliação coletiva, os blogueiros presentes concordaram que o prefeito Fernando Haddad foi o grande perdedor no processo — poderia, por exemplo, ter anunciado sua disposição de reduzir as tarifas depois de ouvir opiniões do Conselho da Cidade, que praticamente endossou a pauta do MPL.
O papel desempenhado por Haddad — que foi ao Palácio dos Bandeirantes para acompanhar o anúncio, falando depois do governador Geraldo Alckmin — também causou estranheza. Como a redução das tarifas foi anunciada quase ao mesmo tempo no Rio de Janeiro, especulou-se sobre um acordo de governantes para aliviar o establishment da pressão das ruas.
A celebração foi grande, tendo em vista que o MPL tem um núcleo duro bastante reduzido de militantes, com idade média calculada no chute em 23 anos de idade. Ainda assim, conseguiu a maior vitória desta geração de jovens militantes nas lutas sociais.
Nota do MPL:
A cidade não esquecerá o que viveu nas últimas semanas. Aprendemos que só a luta dos de baixo pode derrotar os interesses impostos de cima. A intransigência dos governantes teve de ceder às ruas tomadas, às barricadas e à revolta da população.
Não foi o Movimento Passe Livre, nem nenhuma outra organização, que barrou o aumento. Foi o povo.
O povo constrói e faz a cidade funcionar a cada dia. Mas não tem direito de usufruir dela, porque o transporte custa caro. A derrubada do aumento é um passo importante para a retomada e a transformação dessa cidade pelos de baixo.
A caminhada do Movimento Passe Livre, que não começa nem termina hoje, continua rumo a um transporte público sem tarifa, onde as decisões são tomadas pelos usuários e não pelos políticos e pelos empresários. Se antes eles diziam que baixar a passagem era impossível, a revolta do povo provou que não é. Se agora eles dizem que a tarifa zero é impossível, nossa luta provará que eles estão errados.
Por uma vida sem catracas!
Movimento Passe Livre São Paulo
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